02 julho, 2008

verão habitado*

 


Staël, Nicolas de
the sun 
1953








O DEUS DO VERÃO

Chamar-te-ei deus porque és o meu desejo
e o meu desejo é o sol do ar, o sol do sol.
Sinto a febre fresca do teu hálito
na densa consciência deste verão.
Através da madeira ouço as vozes imóveis,
veladas, ao nível do silêncio.
Através de ti respiro na violência do calor
em que o sangue do tempo bate nas paredes.
Todas as figuras adormeceram no vazio.
Mas os teus mil ecos ressoam no sossego
e são eles que aprofundam esta câmara do estio.
Como tu concilias a solidão e a harmonia
e na vacuidade unificas as íntimas estrelas
com a surda veemência de um mundo submerso!
Ó transparente deus que sem estar estás
no sossego luminoso deste pequeno quarto
em que serena pulsa a verdade do ser vivo!

António Ramos Rosa in quinze poetas portugueses do séc. XX, selecção e prefácio de Gastão Cruz, 304

*(não confundir com habitação de verão)

4 comentários:

luis lourenço disse...

Este deus do verão é tão simpático...no mar, na terra e no ar,... e está tão bem cantado neste hino do Ramos Rosa...que apetece embarcar nele...Cada estação tem cores e sons muitos originais...
Vale a pena aproveitar.

tenha um dia feliz.

Duarte disse...

Como sempre, harmonia total com perfeita eleição.

~pi disse...

parece tão risonho e protector ~
este deus...!

nem me lembro do ozono! :)

Myriade disse...

Hmmm, so conheco Madame de Stael, mas desse pintor - pela minha vergonha - nunca ouvi falar. Tem cores interessantes: essa forca dos amarelos