19 maio, 2009

acção (a) gravada



Komad, Z.
God speed your tongue
(2006)





Ouvi a gravação da professora de História.

1. Naquela berraria sem sentido, perturbaram-me fundamentalmente três aspectos: a falta de elegância, a grosseria e a falta de nexo da conversa da professora; as ameaças feitas aos alunos, intoleráveis e a demonstrar que nem sabe as suas próprias limitações; a boçalidade e a rotunda falta de sentido do que é a relação pedagógica, quando a senhora interpela a aluna acerca das habilitações da mãe e, seguidamente, desata a perorar sobre as suas próprias habilitações académicas, numa demonstração inequívoca de que ter habilitações académicas não é sinónimo de ter formação.

2. A ser verdade que este modo de actuação da professora já era do conhecimento generalizado da comunidade escolar, é lamentável a contemporização que continua a existir nestes casos. Se há duas semanas já se sabia destas coisas, não há sequer um sinalzinho da parte do Conselho Executivo? É por estas e por outras, em que a auto-regulação não se faz, que a profissão está como está e tem sido progressivamente desvalorizada. Não são só os poderes instituídos e as circunstâncias sociais em abstracto que têm empurrado os professores para um lugar social pouco apetecível.

3. Qual a diferença entre gravar este episódio e gravar o episódio do telemóvel, acontecido no Carolina, e que levou o aluno que fez a gravação a ser castigado? Porque não foram accionados outros modos de resolução do problema? Ou, mais uma vez, é notória a falta de capacidade dos C. Executivos (não só falta de autonomia, falta de capacidade mesmo, do tipo não ferir susceptibilidades, falta de hábito de actuar, laxismo e proteccionismo, etc etc etc...) e existe necessidade de recorrer a estes expedientes? Expedientes que, confesso, não me agradam mesmo nada.

4. A senhora em causa só pode estar com problemas. A precisar de ajuda. Não da "ajuda"que é fazer de conta que nada se passa, mas de ajuda especializada. Uma pessoa razoável, com alguma educação geral e sentido de humanidade não fala assim com ninguém. Por maioria de razão, um educador não fala assim com educandos.

5. Os sindicatos dos professores. Pois é. O que se esperava. Dizem: esperemos pelo fim do inquérito (ou processo não sei), não nos precipitemos. Não é preciso cruxificar ninguém para que exista uma demarcação clara destes comportamentos. Só falta virem dizer que a conversa foi gravada de forma ilegal. Alegar questões processuais é não enfrentar o embaraço da situação. Mais uma vez não são só os poderes instituídos e as circunstâncias sociais em abstracto que têm empurrado os professores para um lugar social pouco apetecível.

6. Este episódio vai fazer mais pela não existência de um educação sexual nas Escolas do que cinco manifestações dos movimentos pró- e contra tudo e mais alguma coisa ou 5 novenas por esta intenção, promovidas pela Igreja Católica. Estava a ver o vídeo pela enésima vez e a lembrar-me do meu velho amigo D. trabalhador incansável nesta empreitada dos assuntos ligados ao planeamento familiar e à educação sexual. Acabei de o ver na TV exactamente com o ar que lhe imaginei: abatido e revoltado. Até gaguejou um pouco mais do que o normal e multiplicou os "portanto", muleta que lhe conheço desde sempre. Oh D. é muito injusto vir uma senhora que está destrambelhada dar cabo num instante do trabalho de muitos anos. Sim, porque embora a conversa seja tonta, quase toda agente diz que a senhora falava de educação sexual.

7. A comunicação social: usa e abusa destes episódios que lhe parecem brioches em tempo de falta de pão.

15 comentários:

vbm disse...

O mais flagrante foi o teu ponto 4: aquela professora estava visivelmente transtornada psiquicamente e a precisar de ajuda médica. Quando curada, pode até, porventura, ser uma excelente pessoa e até boa professora, imagino eu.

lino disse...

Subscrevo na íntegra:))

mfc disse...

O Ponto 6 é importantíssimo.
A Igreja aplaudiu o acontecimento.

cristal disse...

Aplauso para todo o tratamento que fazes da questão. Agora e sobre educação sexual deixa-me que utilize este teu espaço para um pequeno desabafo (já me desiludi dos grandes). Particamente toda a boa ou má educação sexual que vem sendo feita com algum sentido de responsabilidade nestes quase 40 anos que eu levo de conhecimento da enfermagem, tem sido feita por enfermeiros e enfermeiras que para isso têm qualificação e vontade. Muitas vezes têm servido de "muletas" a outros técnicos bem menos capacitados e têm dado apoio à criação de muita "consulta do adolescente" e outras coisas que tais que, sem a participação destes profissionais muitas vezes não funcionam de todo. Pois a desgraçada lei que veio tentar "regular" (não sei como) essa educação fala em médicos, em psicólogos mas, qunto aos enfermeiros enfiou-os como sempre fazem estes legisladores de meia tigela, nos "outros técnicos". E a dita ORDEM que parece que a única coisa que ordena é o acautelar dos tachos que criou, até agora não disse nada. Já vai longo o desabafo. Mas é também para dizer que a regulação intraprofissional também não é remédio para a falta de educação dos nossos professores ou outros profissionais e que a falta de coragem dos que dirigem tem a ver exactamente com a protecção da mediocridade que tanto zelo merece neste nosso desgraçado país.

Manuel Veiga disse...

... e quem fala (escreve) assim não gagueja!rss

muito bem! aplauso...

Sofia Loureiro dos Santos disse...

Muito bem dito.

Anónimo disse...

Onde é que se ouve a dita gravação? Julguei que era mais uma contra a Educação Sexual, mas pelo seu texto percebo bem que não...

Anónimo disse...

Pronto, já ouvi. Aquilo não é nada normal... Que raio terá levado a professora àquele extremo? A senhora será desequilibrada? Isto desta vez foi grave...

António Torres disse...

Claro que este texto tem que se subscrever integralmente.
Bem como o "cristalino" comentário acima.
Muito bem.
:))

Myriade disse...

Que pena: nao conheco o caso !! Encontra-se no Youtube ?? e onde ??

João Pedro Lopes disse...

Falta apontar o dedo ao verdadeiro escândalo: a professora disse "metestes". Disse mesmo!

Myriade disse...

Obrigada, amiga. Já encontrei um video no Youtube. Mas, só pelo tono da voz nota-se que é uma pessoa com graves disturbios psicologicos ! Para nao mencionar as asneiras que conta sobre anatomia. E triste !! como é possivel que os seus colegas nao notaram que se trata duma pessoa doente que precisa urgentemente dum tratamento psiquiatrico e que havia que proteger aos alunos !!

Anónimo disse...

Posso assinar por baixo?

Arábica disse...

Sol,

estas "crises psicóticas" ou seja o que fôr que lhe aconteceu, não aparecem do nada. De certeza já teria vindo a dar sinais. Mais um caso da vulgar indiferença entre parceiros, entre colegas.

Muito bem apresentado este teu post, sobre um acontecimento a carecer de toda a atenção e tomadas de posição inteligentes.

E que só mostra que a verdadeira educação sexual nas escolas precisa de ser um projecto aprovado e posto em marcha por profissionais competentes para o efeito.

A par do teu D., que não sei quem é, porque não vi a peça de que falas, tenho também uma D. amiga, que muito trabalhou nessa área.

Se assim for, é de lamentar tanto trabalho em vão, tantos projectos perdidos!



Abraço, Solinho.

vbm disse...

«De certeza já teria vindo a dar sinais. Mais um caso da vulgar indiferença entre parceiros, entre colegas.»
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É o "Novo Estado" Corporativo em que o "Velho" Estado Novo nos deixou! Ai de quem toque nas corporações - sejam médicos, professores, advogados, magistrados, farmacêuticos, empresários ou maquinistas! No mínimo, cai uma cortina de silêncio e ostracismo.

Impor-se-ia uma nova Revolução Francesa que abolisse não só os antigos três estados - Clero, Nobreza e Povo -, mas também todas as soluções corporativas, fascistas e fascizantes, que de todo desrespeitam o indivíduo em si por dele fazerem apenas um número da classe profissional.

Porque o que está em causa é muito simples: - e se os interesses da corporação são defendidos à custa de prejudicarem e lesionarem os cidadãos? Ora neste caso, eu quero o Estado ao meu lado para subordinar os profissionais que devem servir-me e não prejudicar-me.