28 novembro, 2010

diz abafo


Betts, William
favela, Rio de Janeiro
(2009)
Mittarakis, Lia
Rio de Janeiro

Tenho andado com o coração apertadinho com o que se está a passar no Rio de Janeiro. Sei que não é assunto fácil e que as soluções simples não existem. O que sinto resulta de um emaranhado racional e emocional que não resiste, em argumentação, além do que a minha sensibilidade geral e do que várias experiências me permitem conhecer.  Uma delas: casal amigo, ambos bastante mais velhos do que eu, militantes de esquerda, activistas de longo tempo, daqueles que enraizaram as suas crenças e ideologia em tempos da ditadura, em combates bem difíceis. A posição contra a violência iam-na buscar sobretudo ao falhanço político e das políticas sociais em particular. As soluções todas longe da utilização de força. Culpas todas do lado da sociedade que produz e segrega os seus filhos menores,  vamos lá a saber quem é mais bandido se os que descem o morro ou os que sobem o planalto. Um dia, na sua casa nova, marido fora no estrangeiro, foi sequestrada na sua própria casa nova. Esteve em cárcere durante dias, de arma apontada, sem comer, sem descansar, a ter de implorar uma ida à casa de banho, tudo o que essas cenas arrastam. Privacidade violada, violência gratuita, requintes de malvadez perante a impotência de quem sozinho nada pode fazer contra três indivíduos armados... Julgo que os seus quase setenta anos a salvaram in extremis das ameaças do último abuso, o abuso sexual explícito. Mas, o que mais a magoou, o que lhe deixou marcas que a levaram à depressão, o  mais difícel de ultrapassar, não foi o que eles levaram, não foi a devassa ter sido tão profunda que teve de vender a casa nova dos seus sonhos, no lugar dos seus encantos. O que a desfez por dentro e por fora, foi ter percebido - os olhos deles Maria, não posso esquecer tanta animalidade - que a sua solução tão óbvia para aquele problema tinha desabado completamente e com ela um certo entendimento do ser humano e do mundo.

6 comentários:

Anónimo disse...

Há tempos fui entrevistar o Moita Flores e, durante a conversa ele disse-me uma coisa que nunca mais deixou de me bailar na cabeça:
" Qualquer homem é capaz de matar".
Pois é...o homem e as suas circunstâncias, não é verdade?
Também tenho seguido com muita apreensão o que se passa no Rio, até porque tenho lá bastante família. Aparentemente, as cisas estão a ser bem resolvdas, mas é de esperar sempre uma reviravolta inesperada.

Maria de Fátima Filipe disse...

É duro sim, mas aconteceu muito com uma certa esquerda que se foi recusando a ver óbvio e não fez o up grade a tempo e horas e quando percebeu que determinados patamares tinham sido ultrapassados e violados, era tarde...

Beijinho para si e para eles.

Anónimo disse...

quando se actua é sempre tarde e por culpa da esquerda...

e a direita o que faz? os negócios do costume...


































Agora quem está enfrentando os desafios mais importantes no Brasil?

mdsol disse...

Oh senhor anónimo ou senhora anónima: e se voltasse a ler porque eu devo ter sido pouco clara, não facilitando a captação do ponto logo à primeira?
Just in case.

jrd disse...

Diz patético...
:(

Isa disse...

:( é muito triste, Maria, muito triste.
Beijinhos